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PARA COMER BEM Por Jairo Marques*

  • Foto do escritor: Leonardo Abreu
    Leonardo Abreu
  • 18 de nov. de 2015
  • 2 min de leitura

As minhas melhores experiências gastronômicas sempre vieram acompanhadas de algo além do prato perfeito, composto de texturas variadas, sabores que se harmonizam e arranjos que cativam os olhos. O comer bem, para mim, exige um maitre que compreenda que o dia de pedir a não da noiva, que esperou por cinco intermináveis anos pelo convite ao altar, tem de merecer uma mesa aconchegante com iluminação capaz de abrilhantar mais o sublime momento do amor.


Exige um chef com sorriso fácil que faça um mimo qualquer quando puder visitar clientes à mesa, seja explicando como tornou aquele camarão tão tenro ou como pode fazer o crème blulée explodir em felicidade na boca.

A gastronomia não pode deixar se esvair no cientificismo da técnica do corte, do flambar, de reduzir, de empanar e de misturar. Ele precisa guardar o encantamento do toque de mágica que faz a crostinha de um filé, da surpresa que eclode em delírio de dentro do bolinho de aipim.


As ambições em torno da cozinha nunca estiveram tão grandes, mas cativar o paladar e amarrar de encantamento o coração de um cliente não se consegue apenas estudando na “Cordon Bleu”. É preciso que o prato, o garçom, o restaurante, o ar, o enfeite da mesa remetam ao glamour de Paris, ao bucolismo do bairro de Betânia, à brisa do Arpoador ou à agitação paulistana.


Quando digo que comi muito bem em algum lugar, é porque se cravou em minha mente aquela bruschetta enfeitada com a atenção de Michelangelo, repete-se no meu peito a poesia de Drummond escondida no cassoulet e revive-se na minha alma a batida suave dos sambinhas de Paulinho da Viola em meio aquela incrível feijoada.


A boa gastronomia tem em si uma harmonia que ultrapassa ingredientes de primeira linha, temperos bem selecionados e mãos habilidosas. Ela é cercada de simplicidade sentimental em suas complexas elaborações, ela se preocupa com o encantamento do paladar sofisticado e com as iniciações de bocas mais humildes.


Restaurantes, cada vez mais, encontram-se aos montes prometendo aventuras do degustar as mais variadas, promissoras e elegantes possíveis. Mas não é à toa que, muitas vezes, o que agrada e faz sucesso entre as pessoas são muquifos estranhos à primeira vista, mas que investem forte no trato, que se esmeram na condução dos pratos e que cada detalhe parece oferecer um caloroso abraço.


Jairo Marques é repórter e colunista do caderno Cotidiano do jornal Folha de S.Paulo

 
 
 

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